segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Ultrassom transvaginal pode ser perigoso

A ultrassonografia transvaginal não reduz o risco de morrer de câncer. Pelo contrário, na maneira como este procedimento é praticado hoje em dia no Brasil, pode ser um perigo para a saúde da mulher.

Eu viajo frequentemente ao Brasil, onde estou passando boa parte do ano para pesquisa acadêmica. Adoro o país e os seus habitantes e, diferentemente da maioria dos estrangeiros, tento entender como a sociedade brasileira chegou a ser esta amálgama única de histórias e culturas de vários continentes. Ou seja, tenho uma ideia da “brasilidade” muito além dos estereótipos de samba, futebol e praia. O Brasil, para mim, é um paraíso de dimensões míticas. Apesar disso, onde se tem muita luz, também se vê sombra.
Quando minha namorada brasileira um dia me contou que, ao fazer o exame ginecológico regular, a médica lhe recomendou também uma sonografia transvaginal, eu fiquei um pouco irritado. Eu lhe perguntei se isso era indicado no caso de pacientes de alto risco ou para aquelas que tivessem antecedentes de câncer de ovário na família. Para minha surpresa, ela afirmou que este não era seu caso. O procedimento simplesmente foi realizado de maneira “preventiva”. Tratava-se de um exame de rastreamento. Na verdade, eu não fiquei chocado pelo uso do ultrassom transvaginal em si, pois este método, devido a sua alta resolução da imagem em comparação com a sonografia tradicional, pode ser considerado muito útil para a diagnose de mulheres grávidas ou com sintomas de alguma doença ginecológica, como miomas ou quistos, tal como para exames dos ovários em pacientes de alto risco. Entretanto, este não era o caso.
Na Alemanha, ao contrário, é bem conhecido que o ultrassom transvaginal não deve ser usado desta maneira despreocupada com fins “preventivos”. É por isso que o seguro obrigatório de saúde não paga este procedimento e as entidades médicas oficiais o consideram desnecessário e, inclusive, perigoso. Segundo o Instituto Alemão de Controle de Produtos e Serviços, o beneficio médico deste exame é “quase nulo”, mas os possíveis danos podem ser “consideráveis”. O Serviço Médico dos Seguros de Saúde, por exemplo, não recomenda seu uso para mulheres da “população média”, ou seja, mulheres saudáveis sem sintomas. Sua aplicação seria, porém, indicada caso o exame ginecológico manual mostre alguma anomalia. Do mesmo modo, o Instituto Alemão de Documentação e Informação Médica do Ministério de Saúde (DIMDI) constata que não tem nenhuma evidencia científica que possa justificar este procedimento como exame de rastreamento.
Ao inverso, devido aos frequentes falsos positivos e devido ao pânico que pode causar uma diagnose errada numa mulher, sem falar das possíveis operações desnecessárias, a sonografia transvaginal “preventiva” é qualificada como um tratamento “negativo”. Os médicos que a oferecem nos seus sites, na contramão das orientações oficiam, ou seja, vendendo o exame como se fosse um serviço particular para a “prevenção do câncer”, são advertidos pela Associação de Proteção ao Consumidor, a ponto de precisarem retirar estes anúncios sob pena de processo jurídico. Por isso, nenhuma organização profissional médica da Alemanha recomenda atualmente este exame para previr câncer de ovário ou câncer endometrial, devido aos resultados assustadores de quatro grandes estudos empíricos que foram realizados nos últimos anos na Europa, no Japão e nos EUA.
Nos EUA, tanto a Associação de Ginecologia e Obstetrícia, como o grêmio Prostate, Lung, Colorectal, and Ovarian Cancer Screening Trial (PLCO) que aconselha o governo dos EUA, assim como todas as grandes instituições de pesquisa oncológica, rechaçam este método como forma de prevenir câncer. Segundo a Aliança Nacional contra o Câncer de Ovário, os riscos provocados por falsos positivos não são menores, pois algumas mulheres já até morreram por causa de operações desnecessárias.
Isto tem a ver com o fato de um estudo amplo realizado pelo PLCO, o qual foi publicado em 2011, evidencia que, até hoje, quase nenhuma mulher tenha se salvado do câncer, graças à ultrassonografia transvaginal. Este estudo se fundamenta na base empírica mais completa até agora. Trata-se de uma pesquisa realizada com cerca de 78.000 mulheres durante treze anos, ou seja, se baseando numa mostra estatisticamente bastante significativa. No final do estudo, no entanto, na metade das pacientes que foi tratada com ultrassom transvaginal a taxa de morte por câncer de ovário foi mais alta do que no grupo das mulheres tratadas com métodos convencionais (118/100)! O grande problema é que o câncer de ovário é um assassino silencioso e agressivo, sem ter muitas possibilidades de ser detectado num estado preliminar, caso tenha estado preliminar. Convencer as mulheres que a ultrassonografia oferece uma espécie de “proteção” contra a doença é simplesmente uma mentira e absolutamente antiético, pois cria uma falsa ilusão de salubridade nas mesmas. Até hoje, a etiologia deste câncer é desconhecida, sua detecção e sua cura são difíceis.
Mas o que transforma o ultrassom transvaginal num perigo grave para muitas pacientes é a alta taxa de falsos alarmes que este método produz, como já os tinha mencionado acima. Segundo as pesquisas europeias e norte-americanas, a precisão do método é tão baixa que muitos achados resultam sendo falsos positivos, e muitos tumores existentes simplesmente não são detectados, pois a tecnologia ainda não é suficientemente madura. É mais um aspecto assustador do estudo do PLCO: em cada 100 mulheres, nas quais o ultrassom transvaginal encontrou uma anomalia, no final, só uma mulher foi diagnosticada com câncer de ovário. As outras 99 anomalias achadas eram, portanto, casos de sobrediagnóstico. De todo modo, cada terceira destas mulheres teve que se someter a uma intervenção cirúrgica, e em cada sexta destas operações houve complicações graves.
Os responsáveis da pesquisa resumem os resultados da seguinte maneira: “Este estudo mostra que os testes disponíveis não são eficazes e podem realmente causar danos por causa do elevado número de falsos positivos. Estes resultados apontam para a necessidade contínua de ferramentas de rastreio mais precisas e eficazes.”
Depois de me aprofundar um pouco nesta matéria, eu fiz uma pequena pesquisa na internet para saber qual a opinião dos médicos brasileiros sobre o assunto. E desta vez o choque foi ainda maior! Não tem praticamente nenhum site que esclareça, de maneira neutra, sobre as limitações e riscos da ultrassonografia transvaginal. Pelo contrário, quase todos os sites de clínicas e consultórios enaltecem este exame como um excelente método para prever o câncer. Recomenda-se o seu uso em intervalos regulares para mulheres completamente saudáveis: Assim, no site www.oncoguia.org.br, podemos ler o seguinte: “O melhor método para avaliação periódica e preventiva do câncer de ovário é o ultrassom transvaginal, que é o exame que apresenta sensibilidade e especificidade para detectar o câncer ovariano.”
Além disso, não achei nenhum site que fizesse referência aos estudos empíricos dos EUA e da Europa, embora o estudo do PLCO fosse amplamente divulgado nas revistas especializadas e na imprensa. Eu me pergunto então: Por que acontece isto no Brasil? Como não pode ter nenhum tipo de reflexão crítica sobre o assunto? A ciência não é universal? Enquanto os médicos brasileiros parecem desconhecer os riscos deste método, na Alemanha, uma equipe de médicos contratada pelo Ministério de Saúde acaba de ganhar um prêmio por ter comprovado os perigos deste exame por meio da pesquisa empírica (Prêmio David Sackett por medicina baseada em evidência, 16 de março de 2012)! No reporte final do seu estudo, fica evidente que o exame traz mais malefícios que benefícios à grande parte das mulheres, desde que seja praticado de maneira “preventiva”. Os autores também recomendam aos médicos que fiquem mais cientes dos estudos empíricos, em vez de se orientar nas suas experiências práticas só. Por último, exigem que as pacientes devam ser informadas de maneira transparente e imparcial sobre os riscos e limitações deste exame.

Fonte: Blog Saúde Brasil

2 comentários:

  1. Olá boa tatde fiz um exame trasvaginal dia 25/05/18 e ate hoje estou sentindo dores abdominal ja tinham feito outras vez e não ficavam doído pergunto é normal 13 dias e ainda esta sintir dores?

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    1. Nossa! Indicaram esse exame para mim e estou em pânico sabendo que praticamente todo ginecologista estuprador do país está impune! Várias meninas e mulheres violentadas e traumatizadas por exames totalmente invasivos colocados como "naturais": muito triste isso! Li vários relatos de vítimas de ferimentos abusivos durante esse exame! 😥

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