terça-feira, 30 de setembro de 2014

Aborto é problema de saúde pública, alerta Anistia Internacional


Aborto

A Anistia Internacional defendeu quarta (24) que o aborto seja tratado como uma questão de saúde pública e de direitos humanos, e não criminal. O pedido pelo debate urgente no país veio depois da confirmação das mortes de Jandira Magdalena dos Santos Cruz, de 27 anos, e Elisângela Barbosa, de 32, após interromperem gravidez, de forma clandestina, no Rio de Janeiro.
No Brasil, estimativas apontam que em torno de 1 milhão de mulheres fazem abortos clandestinos todos os anos, e 200 mil morram em consequência da operação. De acordo com o cientista político e assessor de Direitos Humanos da Anistia Internacional Brasil, Maurício Santoro, a criminalização da prática também é um problema muito grave de discriminação socioeconômica.
“A gente sabe que nos casos em que as mulheres são presas porque abortaram, são os feitos em casa. Ela procura o hospital depois, e acaba respondendo a processo. Então, aquelas que têm condições de procurar uma clínica clandestina, de melhor qualidade, não são criminalizadas, porque não sofrem as consequências de um aborto mal feito. Essa é uma das perversidades do aborto ilegal”, segundo Santoro.
Ele cita levantamento feito no estado do Rio de Janeiro, de 2007 a 2011, no qual foram encontradas 334 mulheres que sofreram processos criminais por terem abortado. Muitas delas moradoras no interior, na Baixada Fluminense e no subúrbio carioca.
Para a Anistia Internacional, o Brasil deve cumprir os compromissos já assumidos. Como lembra Santoro, é essencial que haja debate para implementar na legislação acordos que já foram assumidos pelo Brasil no plano internacional. Caso, por exemplo, do Acordo do Cairo, há 20 anos, segundo o qual as mulheres que abortaram devem ser tratadas com humanidade, não como criminosas; e no ano passado, a Conferência de Montevidéu, que reuniu países latino-americanos para debater direitos sexuais e reprodutivos, também destacou que a abordagem da criminalização é negativa, porque “traz consequências para a saúde pública extremamente ruins”.
A professora da Universidade de Brasília e pesquisadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, Débora Diniz, que conduziu a Pesquisa Nacional do Aborto, em 2010, lembra que o levantamento apontou que uma em cada cinco mulheres, até 40 anos de idade, fez pelo menos um aborto. Portanto, “a prática já ocorre, e somente a legalização pode salvar vidas”, ressaltou.
“Nós estamos falando de 7,4 milhões de mulheres de 18 a 39 anos. É fato comum à vida reprodutiva das mulheres. Esse é o quadro do aborto no Brasil, que, por ser ilegal, leva as mulheres à clandestinidade, na qual um procedimento médico sem risco, em termos técnicos, passa a ser de altíssimo risco, porque muitas se submetem a procedimentos com profissionais não regulamentados, não monitorados, não conhecidos”, explicou.
A coordenadora da organização não governamental Católicas pelo Direito de Decidir, Rosângela Talib, enfatiza que a proibição, tanto da lei quando da Igreja, não coíbe a prática do aborto. “A gente sempre pensou o aborto como questão de saúde pública, porque a interdição legal – o Código Penal diz que é crime – ou a interdição religiosa católica – diz que é pecado mortal – não têm evitado que as mulheres abortem e, infelizmente, não conseguem evitar a morte de muitas delas, como a gente viu agora dessas duas mulheres no Rio de Janeiro. É a ilegalidade do aborto que provoca essas mortes. Por isso, a gente trabalha pela descriminalização e pela legalização do aborto”, enfatizou.
Rosângela lembra que o aborto é a quinta maior causa de morte materna no Brasil, e ressalta que o ideal seria que ninguém precisasse interromper uma gravidez, mas às vezes o fato é inevitável. Segundo ela, “sempre vai ter uma gravidez indesejada, porque a gente sabe que nenhum método é 100% seguro. Então, ante uma gravidez indesejada, a gente acredita que é uma questão de saúde pública, e as mulheres, quando assim o desejarem, devem ter a possibilidade de fazer a interrupção da gravidez no serviço público de saúde, sem risco para sua saúde”.
O assessor da Anistia Internacional lembra que em países que legalizaram a prática, como o Uruguaio fez em 2012, o número de abortos diminuiu e a morte por essa causa zeraram. “Impressionante como as mulheres pararam de morrer no Uruguai, por causa do aborto”, argumentou, “porque [o procedimento] passou a ser feito de maneira segura, controlada”.

Fonte: EBC
Por Akemi Nitahara, repórter da Agência Brasil.


28 de Setembro. Dia Latinoamericano de Luta pela Descriminalização do Aborto. Participe e Assine a Petição!

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Interrupção da gravidez é quinta maior causa de morte materna

“O aborto ser ou não legal não teria mudado a minha decisão. Só teria permitido que eu não corresse risco de vida como corri”. O depoimento é de X., de 30 anos, que recorreu, há dez anos, ao procedimento, só permitido legalmente em alguns casos no Brasil. Aos 20 anos, ela ingeriu um remédio abortivo e findou uma gravidez de cinco semanas, sozinha, no banheiro de casa.
Ao longo dos dez anos em que a jovem guardou o segredo, estimativas indicam que entre 7,5 milhões e 9,3 milhões de mulheres também interromperam a gestação no Brasil entre 2004 e 2013. Apesar de afetar milhares e custar aos cofres públicos pelo menos R$ 142 milhões por ano, o aborto continua sendo tratado como uma questão delicada nas campanhas à Presidência da República, e a maioria dos candidatos procura driblar o assunto.
Nem todas são internadas
O tabu que cerca o tema leva à imprecisão dos números. Resultados preliminares do estudo “Magnitude do abortamento induzido por faixa etária e grandes regiões”, obtido com exclusividade pelo GLOBO, mostram que, somente no ano passado, foram 205.855 internações decorrentes de abortos no país, sendo que 154.391 por interrupção induzida.
Fonte: “Magnitude do abortamento induzido por faixa etária e grandes regiões”.
Fonte: “Magnitude do abortamento induzido por faixa etária e grandes regiões”.
Este número, no entanto, é apenas uma ponta do iceberg. As estimativas de abortos do estudo conduzido pelos professores Mario Giani Monteiro, do Instituto de Medicina Social da Uerj, e Leila Adesse, da ONG Ações Afirmativas em Direitos e Saúde, revelam que o número de abortos induzidos é quatro ou cinco vezes maior do que o de internações.
Com isso, é possível calcular que o total de abortos induzidos em 2013 variou de 685.334 a 856.668. No entanto, segundo dados do Ministério da Saúde, foram apenas 1.523 casos de abortos legais (por estupro, ameaças à saúde materna e anencefalia fetal) no período. Quinto maior causador de mortes maternas no Brasil, o aborto tem um custo financeiro tão alto quanto o emocional.
Repórteres do GLOBO calcularam, com base em dados do estudo, e do DataSus, quanto os governos gastam com complicações decorrentes de interrupções da gravidez — a maioria clandestina. No ano passado, foram 205.855 internações decorrentes de abortos no país — sendo 51.464 espontâneos e 154.391 induzidos (ilegais e legais). Levando em consideração que o valor médio da diária de uma internação no SUS é de R$ 413 e que as hospitalizadas passaram apenas um dia sob cuidados médicos, o governo gastou R$ 63,8 milhões por conta dos abortos induzidos.
Também em 2013, foram 190.282 curetagens (método de retirada de placenta ou de endométrio do corpo), a grande maioria de quem quis interromper a gravidez. Isso teria custado um total de R$ 78,2 milhões, já que, pela tabela do SUS, cada intervenção custa, em média, R$ 411. No total, chega-se a, no mínimo, R$ 142 milhões.
Número pode ser mais alto
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), a situação pode ser ainda mais alarmante. O número de abortos pode ultrapassar um milhão de mulheres, segundo um estudo publicado em 2013 pelo braço do órgão na América Latina, a Organização Pan-americana de Saúde.
Segundo o estudo de 2010, feito pela Universidade de Brasília (UnB), tido como referência pela OMS, e comandado pelos pesquisadores Débora Diniz e Marcelo Medeiros, uma a cada cinco mulheres com mais de 40 anos já fizeram, pelo menos, um aborto na vida. Hoje, no Brasil, existem 37 milhões de mulheres nessa faixa etária — de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dessa forma, estima-se que 7,4 milhões de brasileiras já fizeram pelo menos um aborto na vida.
— É evidente que a proibição de interromper a gravidez voluntariamente não evita que as mulheres recorram ao abortamento clandestino e inseguro, às vezes em total desespero, devido ao enorme problema que significa uma gravidez indesejada no momento — afirma Monteiro.
Problema de saúde pública
De acordo com estudo da UnB, de 2010, o método mais comum é que a mulher comece o aborto em casa, com medicamento e vá para a rede pública fazer a curetagem.
— O aborto hoje é um problema de saúde pública e deve ser discutido pelos três poderes. Os custos e as complicações dos abortos ilegais são enormes. Clinicamente as mulheres podem ter infecções, contrair doenças que incluem a Aids, ter hemorragias que podem levar à morte e ter perdas de órgãos internos. E isso vai parar nas mãos do Estado. As pessoas vão recorrer também ao SUS — explica Sidnei Ferreira, presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj).
Segundo especialistas, além disso, o sistema público acaba precisando disponibilizar remédios para tratamentos, centro cirúrgicos (que têm alto custo) e deslocar médicos e enfermeiros.
— Sem dúvidas, se esses procedimentos fossem feitos com responsabilidade, em lugares equipados com fiscalização, as complicações seriam menores. Eu não acredito que os números de abortos aumentaria se fosse legalizado, como defende quem é a favor da proibição. O número é absurdamente alto. É preciso se discutir e achar um molde, onde o aborto não seja feito indiscriminadamente. Mas as pessoas precisam parar de morrer. Nenhuma mulher gosta de fazer aborto. É um abalo muito forte psicológico e uma dor física enorme — relata Ferreira.
Complicações frequentes
As complicações também são frequentes. No Rio de Janeiro, um caso chamou a atenção para o perigo das clínicas clandestinas. A auxiliar administrativa Jandira Magdalena dos Santos Cruz desapareceu em agosto após entrar num carro rumo a uma clínica ilegal em Campo Grande para fazer um aborto. Ela teria morrido durante o procedimento e a polícia suspeita que seu corpo tenha sido incendiado e esquartejado.
A irmã da jovem, Joyce Magdalena, diz que já perdeu as esperanças de encontrá-la viva:
— Sou realista. Sei que ela não está mais viva. Infelizmente, a polícia não atua com rigor contra as clínicas de aborto, até porque, há policiais envolvidos. No caso da minha irmã, um policial atuava no bando.
Enquanto Jandira procurou uma clínica, X. preferiu recorrer ao Cytotec, remédio usado como abortivo, por induzir o parto em qualquer estágio da gravidez, em casa. Já Y., que descobriu que sua filha tinha um problema genético grave, cogitou tomar o remédio por conta própria, que compraria por R$ 350, ou apelar para uma clínica:
— Ainda tentando as formas legais ou seguras de fazer um aborto, fui a um especialista renomado que me disse: “espera duas semanas para fazer. Se ela não morrer naturalmente, eu mesmo faço.” Fizemos um exame e nesse dia descobrimos que ela já estava morta há uns dias. Fui para uma maternidade e usei lá o Cytotec. Senti as maiores dores da minha vida.
 Fonte: O Globo

28 de Setembro. Dia Latino-americano de Luta pela Descriminalização do Aborto. 

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Roda de Conversa com Travestis — Projeto Arco Íris Afroreggae


Excluída pelo resto da população, que transforma em desafio um ato simples como o de sair nas ruas, e com dificuldades para trabalhar devido à violência e ao preconceito, a comunidade LGBT tem direito à cidadania plena.
O AfroReggae queria encontrar uma ação de defesa ampla para essa classe, e depois de 3 meses de muita pesquisa de rua, cinemas, pontos de prostituição, idas a várias favelas para conversar com travestis e suas famílias, nossa equipe formulou o Além do Arco Íris, que serve de auxílio para que elas consigam se inserir na sociedade e fugir dessa realidade assustadora que vivem.

O Serviço de Epidemiologia foi convidado para discutir neste grupo, ações de prevenção e promoção da saúde, com foco na DST, direto e cidadania, trabalho, e qualidade de vida. Foi um sucesso!


sexta-feira, 19 de setembro de 2014

16/09/2014 - Visita Técnica ao Núcleo de Vigilância Hospitalar da MMABH - EEAAC/FF


No dia 16 de setembro de 2014, a professora Carina Bulcão, da Escola de Enfermagem Aurora Afonso Costa - UFF, trouxe seus alunos do 6º período à MMABH, para entenderem a dinâmica de trabalho de um Núcleo de Vigilância Hospitalar. Os Serviços de Controle de Infecção e de Vigilância Epidemiológica Hospitalares enfatizaram a importância do profissional de saúde estar atento aos agravos de importância epidemiológica, ao controle de infecções relacionadas a assistência à saúde. As profissionais Mercedes Neto e Carolina Felippe expuseram as taxas da MMABH, o êxito nas ações de vigilância, além da interface e parceria que os serviços construíram para construção do NVH da MMABH.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Dois casos de febre chikungunya são confirmados em território amapaense

Casos da doença são os primeiros registrados no Brasil. 
CVS desenvolve plano para conter vírus na área de fronteira.


Os dois primeiros casos de contaminação pelo vírus chikungunya confirmados no país foram registrados no Amapá. A informação foi confirmada pelo Ministério da Saúde (MS) nesta terça-feira (16) e pela Coordenadoria de Vigilância em Saúde no Amapá (CVS) . Em junho de 2014, o órgão estadual alertou sobre a entrada do vírus no estado através da fronteira com a Guiana Francesa.

Segundo a coordenadoria, os infectados são um homem de 59 anos e a filha dele, de 31 anos. Ambos residem no município de Oiapoque, localizado no extremo-norte do estado, a 590 quilômetros de Macapá.

A CVS informou que ambos apresentaram sintomas semelhantes aos da dengue, no fim de agosto, e foram buscar atendimento em um posto de saúde. A equipe de enfermagem da unidade os encaminhou para o Laboratório de Fronteira (Lafron) de Oiapoque, onde foram retiradas amostras de sangue.
Iracilda Silva Pinto, chefe estadual da Divisão Epidemiológica (Foto: John Pacheco/G1)Iracilda Silva Pinto, chefe estadual da divisão
epidemiológica (Foto: John Pacheco/G1)
O primeiro resultado do exame feito nos dois pacientes não apontou contaminação pelo vírus transmissor da doença. De acordo com a CVS, o Lafron solicitou novas amostras de sangue dos pacientes que foram enviadas ao Instituto Evandro Chagas (IEC), em Belém, no Pará.
Os exames feitos pelo instituto apontaram que a mulher estava infectada com o vírus chikungunya e o vírus da dengue. O homem havia contraído apenas o chikungunya, segundo apontou a coordenadoria.
A chefe estadual da divisão epidemiológica, Iracilda Pinto, disse que os pacientes receberam tratamento adequado e não correm risco de morte. “O homem já está curado, mas a filha ainda está sob observação médica”, disse.

Iracilda informou que os números de casos suspeitos do chikungunya no Amapá são preocupantes. Dez casos suspeitos estão sendo monitorados em Oiapoque e outros onze em Macapá.
Técnicos do Ministério da Saúde visitaram o município no início de setembro e auxiliaram funcionários da CVS a montar um plano operacional de contenção da doença, onde serão realizados procedimentos de investigação epidemiológica e controle vetorial, borrifação, além de busca ativa de criadouros para evitar a disseminação do vírus.
Sintomar da febre chikungunya (Foto: Reprodução/TV Globo)Sintomas da febre chikungunya
(Foto: Reprodução/TV Globo)
“O tráfego de pessoas que vêm da Guiana Francesa para Oiapoque, e vice-versa, é intenso. Aí que está o perigo, pois o ir e vir das pessoas na área de fronteira favorecem para a proliferação da doença no estado”, alertou.

Até agosto de 2014, dois casos importados da doença foram confirmados pelo Laboratório Central do Amapá (Lacen). Em todos os registros, os pacientes contraíram os sintomas quando estavam em outros países, como Guiana Francesa e Guadalupe.

Chikungunya
O vírus chikungunya foi identificado pela primeira vez entre 1952 e 1953, durante uma epidemia na Tanzânia. Mas casos parecidos com essa infecção – com febres e dores nas articulações – já haviam sido relatados em 1770. O agente transmissor é o mosquito aedes aegypti, mesmo causador da dengue, e aedes albopictus.
Quais são os sintomas?
Entre quatro e oito dias após a picada do mosquito infectado, o paciente apresenta febre repentina acompanhada de dores nas articulações. Outros sintomas, como dor de cabeça, dor muscular, náusea e manchas avermelhadas na pele, fazem com que o quadro seja parecido com o da dengue. A principal diferença são as intensas dores articulares.
Tem tratamento?
Não há um tratamento capaz de curar a infecção, nem vacinas voltadas para preveni-la. O tratamento é paliativo, com uso de antipiréticos e analgésicos para aliviar os sintomas. Se as dores articulares permanecerem por muito tempo e forem dolorosas demais, uma opção terapêutica é o uso de corticoides.
Fonte: G1 em 18/09/2014.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Diabetes caminha para uma epidemia em câmera lenta


saude coletiva

Dados quantitativos podem revelar muito de cenários relacionados a possíveis endemias, epidemias e surtos em todo o mundo. Entretanto, somados às análises de pesquisadores envolvidos em investigações por mais de 20 anos, fortalecem essas perspectivas. Esse é o caso de Maria Inês Schmidt, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que proferiu a conferência “Diabetes: uma epidemia em câmera lenta?”.
Sob três caminhos que se relacionam no destino final, Maria Inês iniciou sua participação no Epivix 2014, apresentando correntes de estudos que colocavam essa afirmativa de epidemia do diabetes ainda como uma incógnita; outros que sinalizavam e defendiam que esses dados não passavam de um artefato estatístico; e ainda os que afirmavam que realmente estamos vivendo uma epidemia em câmera lenta (expressão essa utilizada por Margareth Chan quando apresentou o problema das doenças crônicas na ONU em 2011).
“Será que estamos vivendo realmente uma epidemia? Se estamos, quais as causas e consequências? E como podemos controla-la?” foram os pilares de sua explanação.
Maria Inês apresentou muitas informações para responder à primeira contestação como os dados disponíveis no site da Federação Internacional de Diabetes, onde há o Atlas de 2013 e o número de 382 milhões de pessoas com a doença, e ainda a informação de que 46% dos casos não são diagnosticados. “Esses dados não são para fazer nenhum tipo de advocacia do diabetes, mas apenas para ilustrar esse cenário que defende essa epidemia. Essa porcentagem de 46% também se deve ao fato de que o diabetes tipo 2, como quase todas as doenças crônicas, tem uma fase latente e depois uma fase em que já é chamado de diabetes por atender a alguns critérios diagnósticos, quando permanece assintomático podendo ficar assim por um período de 5 a 10 anos. Depois vem a parte sintomática. É nessa fase que os diagnósticos costumam a ocorrer”, explica.
“Estamos nos alimentando mal, isso é fato. A população está mais obesa. Estamos sedentários. Mas também precisamos refletir sobre como mudar esse cenário porque não são mudanças individuais, mas que as sociedades criaram ao longo dos anos. Não são as pessoas que têm diabetes, mas a sociedade que fica doente”, ressaltou.
Maria Inês enfatizou que é preciso olhar com atenção aos fatores causais, como a cesariana, com a qual tem aumentado o risco de obesidade nas crianças. “O diabetes se manifesta muito em sua morbidade. O diabetes tipo 2 tem complicações crônicas que reduzem substancialmente a qualidade de vida das pessoas. As complicações cardiovasculares são uma causa de morbidade, difícil de retirar dos registros oficiais. Ainda assim, pesquisas apontam uma redução desses casos em vários países, devido às intervenções que estamos realizando para reverter essa situação nas últimas décadas. Entretanto há outras complicações, como exemplo, doença cardiovascular periférica e neuropatia que são uma causa muito importante de amputação de membros inferiores”, disse. Outras consequências são as complicações renais, podendo levar o indivíduo ao estágio renal crônico terminal em alguns casos.
E como podemos controla-la? Segundo Maria Inês Schmidt, fazem-se necessárias três estratégias fundamentais: 1) políticas públicas de promoção da saúde que possibilite a todos, formas mais saudáveis de viver, e com isso estaremos enfrentando várias epidemias de doenças crônicas; 2) atenção integral a quem tem diabetes (ênfase para terapias custo-efetivas, que aqui é fundamental porque a carga vai crescer e o sistema de saúde vai ficar sobrecarregado; 3) prevenção primária (mas não daquela de chamar as pessoas nas ruas, nas comunidades, mas para aquelas pessoas que estão no sistema de saúde por outras condições como hipertensos, mulheres grávidas, obesos que apresentam alguma morbidade associada.)

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Participação da Epidemiologia - Congresso ALASS 2014


Nos dias 04, 05 e 06 de setembro de 2014 foi realizado o XXV Congresso de ALASS[1], sob tema “Profisionales de la salud al servicio de la ciudadanía: demografia, formación y desarrollo profesional”, e a Maternidadade Maria Amélia Buarque de Hollanda, sob a gestão da Organização Social Rede de Proteção à Saúde, escreveu um trabalho científico intitulado Maternidade Maria Amélia Buarque de Hollanda: implantação de um modelo de gestão na atenção materno-infantil, que foi aprovado pela Comissão Científica e apresentado em formato de pôster.
A apresentação do trabalho foi realizada pelo diretor técnico Dr. Wallace Mendes, expondo o processo de implantação da unidade e os indicadores de produtividade gerencial e assistencial. Além destas atividades, Dr. Wallace Mendes e a Epidemiologista Mercedes Neto participaram das mesas redondas do evento e salas de discussão.




[1] ALASS [Associação Latina de Análise dos Sistemas de Saúde] foi fundada em 27 de Janeiro de 1989 em Lugano. É uma rede viva de cientistas (professores e investigadores) e profissionais (gestores, planificadores, designers de políticas) do âmbito sanitário, interessados em contribuir para a resolução de numerosos problemas dos sistemas de saúde dos países latinos.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Desafios do sistema de saúde brasileiro

Por Ana Luiza d´Ávila Viana (1), 
Hudson Pacífico da Silva (2), 
Luciana Dias de Lima (3), 
Cristiani Vieira Machado (4)
Apesar das recentes dificuldades relacionadas ao cenário do capitalismo mundial, diversos fatores sugerem que o Brasil desfruta de uma posição privilegiada entre os países da América Latina para dar forma a um novo modelo de desenvolvimento, capaz de integrar as políticas econômicas e sociais, conferindo lugar de destaque às políticas universais.
O país é uma das maiores economias do mundo; possui uma democracia recente, porém estável; dispõe de instituições políticas relativamente sólidas; tem uma população numerosa, com uma proporção ainda expressiva de jovens; uma Constituição nacional que assegura direitos sociais amplos; e um desenho de sistema de saúde público e universal – o Sistema Único de Saúde (SUS) –, singular entre as nações capitalistas da América Latina.
Entretanto, a criação e a expansão do SUS, ao longo dos últimos 25 anos, ocorreram em meio a distintas – e por vezes contraditórias – concepções de Estado Social. De um lado, o SUS nasceu sob a égide da abrangente proposta de Seguridade Social inscrita na Constituição de 1988, baseada em um desenho integrado e universalista das políticas sociais e sustentado por intensa mobilização de atores políticos setoriais; de outro, sua implantação, na década de 1990, ocorreu em um contexto desfavorável à expansão das funções do Estado, tanto na área econômica como na área social. Na década seguinte, houve uma retomada da valorização do Estado, porém sob um modelo de articulação entre o econômico e o social que conferiu pouco espaço às políticas sociais universais. Apesar do cenário adverso, o SUS propiciou mudanças importantes.
Em primeiro lugar, construiu-se uma estrutura de serviços descentralizada, calcada no desenho federalista, que favoreceu a criação de uma base de apoio formada por líderes políticos e outros atores locais e regionais. O processo de descentralização ocorreu sob a progressiva redução da participação federal no financiamento, e na maior assunção subnacional dos gastos, dos arranjos assistenciais, da gestão do mix público-privado e do padrão e extensão de cobertura.
Em segundo lugar, ocorreu uma expressiva expansão dos serviços de atenção primária em saúde no território nacional, propiciada pelo amplo consenso, dentro e fora do país, em torno do tema, com repercussões positivas no acesso e na melhoria de alguns indicadores de saúde da população. No entanto, o SUS recebeu pouco investimento de forte conteúdo tecnológico no período, enquanto os serviços privados na área diagnóstica, terapêutica e hospitalar de alta complexidade se expandiram principalmente nos maiores centros urbanos.
Assim, se alastrou outro processo, o da intensa participação privada na assistência à saúde, de diversas formas: na oferta de serviços; na oferta e incorporação (muitas vezes acrítica) de tecnologias de ponta para todos os tipos de procedimentos médicos; na intermediação financeira no mercado de saúde; no estímulo à constituição de grandes grupos capitalistas de caráter multinacional na área, envolvendo serviços, finanças e indústria. Essa expansão privada teve forte financiamento e subsídio estatal, o que explica, em parte, o fato de o gasto privado ser maior que o gasto público em saúde no Brasil. Explica, também, a existência de um mercado de saúde de natureza privada operando fora e dentro do SUS.
Essa coexistência entre o público e o privado tem produzido efeitos deletérios sobre a eficiência geral do sistema de saúde, tais como: tendências à incorporação tecnológica e custos crescentes sob controle restrito (ou mesmo descontrole) e primazia na busca de lucros pelas empresas.
Os efeitos são deletérios também sobre a equidade, visto que perpetuam as desigualdades de acesso, utilização e qualidade dos serviços entre os cidadãos, conforme suas capacidades de pagamento e de usufruto da atenção disponibilizada nos distintos segmentos. Esse arranjo tende, ainda, a colocar os serviços públicos de saúde em situação de complementariedade aos privados, nos casos de “clientes” que não interessam aos mercados, como os idosos, pessoas com doenças crônicas ou que requerem tratamentos de alto custo.
No momento atual de implementação do SUS, os desafios mais urgentes podem ser agrupados em três grandes itens: 1) expansão, qualificação e regionalização da oferta dos serviços e ações de saúde; 2) financiamento estável e suficiente para dar conta do princípio da universalidade; 3) construção de estratégias e políticas de regulação visando maior equidade nos processos de incorporação tecnológica e na relação público-privado.
(1) Professora do Departamento de Medicina Preventiva/Faculdade de Medicina/Universidade de São Paulo. Bolsista de Produtividade do CNPq.
(2) Professor da Faculdade de Ciências Aplicadas/Universidade Estadual de Campinas.
(3) Pesquisadora do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde/Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Fundação Oswaldo Cruz. Bolsista de Produtividade do CNPq.
(4) Pesquisadora do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde/Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Fundação Oswaldo Cruz. Bolsista de Produtividade do CNPq.
Fonte: Cebes